CEstA Intempestiva com Eduardo S. Nunes (UFOPA)

 

CEstA Intempestiva – Eduardo S. Nunes (Programa de Antropologia e Arqueologia,Universidade Federal do Oeste do Pará) A cortina de água e os cupinzeiros na estrada: comentários sobre cosmografia e perspectiva a partir do caso karajá

Resumo: O patamar inferior do cosmos inỹ (Karajá, Javaé e Ixỹbiòwa) é o Berahatxi, o Fundo do Rio. Alguns autores da literatura específica, perseguindo uma maior precisão descritiva, argumentam que, a despeito de uma clara associação aquática, esse mundo não estaria localizado dentro do rio, e sim abaixo do leito do rio. Nessa comunicação, pretendo mostrar que as evidências elencadas para sustentar tal afirmação – sobretudo o fato de que se trata de um mundo seco, onde “se respira como aqui” –, não remetem à necessidade de precisar melhor a localização do Fundo do Rio, mas sim a uma diferença de perspectiva entre os seres que o habitam e os Inỹ, moradores do Mundo de Fora – o que é seco para uns, é submerso para outros. Há, como efeito, uma série de evidências nesse sentido, em relação ao patamar inferior tanto quanto ao patamar superior do cosmos. E isso, acredito, traz algumas considerações importantes sobre o tipo de exercício etnográfico que poderíamos chamar de cosmografia. Pois, se levamos a questão a sério, cedo ou tarde será preciso decidir do ponto de vista de quem o cosmos está sendo diagramado. Como resultaria um diagrama do cosmos se assumíssemos a perspectiva dos moradores do Fundo do Rio? E se assumíssemos aquela dos Moradores do Alto? Exploro essas possibilidades gráficas, correlacionando-as à etnografia, para depois reconstituir a imagem inicial (que remete, na literatura, à estrutura do cosmos “como um todo”). Mas a imagem resultante não mais suprime as diferenças de perspectiva, e sim as evidencia, pois as metades da figura, como no dualismo diametral, são o inverso uma da outra, e não sua imagem especular. O que tal figura mostra, assim argumento, é que, em lugar de uma relação ternária (os três patamares sendo termos simétricos), temos sempre um “dualismo assimétrico” entre dois patamares, ao passo que o terceiro é a perspectiva que situa cada diagramação possível.

Departamento de Antropologia - Sala 14